TJBA - DIÁRIO DA JUSTIÇA ELETRÔNICO - Nº 3.036 - Disponibilização: quarta-feira, 9 de fevereiro de 2022
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vida, ainda que curta, digna ao recém nascido e, consequente, uma morte menos sofrida, tanto para ele como para os seus genitores. Sobre os
cuidados paliativos, o Código de Ética Médica dispõe:
Princípios Fundamentais (Capítulo I)
XXII - Nas situações clínicas irreversíveis e terminais, o médico evitará a realização de procedimentos diagnósticos e terapêuticos desnecessários e propiciará aos pacientes sob sua atenção todos os cuidados paliativos apropriados.
Acerca da caracterização de falha no serviço médico-hospitalar decorrente de violação ao direito subjetivo do paciente (e familiares) aos
cuidados paliativos, cito jurisprudência do Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro, na qual a Des(a). Maria Helena Pinto Machado expôs, de
maneira precisa, as seguintes questões:
“(...) havia necessidade de ministrar ao paciente cuidados paliativos, considerando que se tratava de doença terminal em estágio avançado,
consoante narrativa aposta na inicial e corroborada pela expert do Juízo, e, apesar disto, a equipe decidiu mantê-lo na sala amarela, mesmo
sendo inadequada ao seu estado de saúde.
(...)
Enfim, na fase terminal da doença, em que o paciente tem pouco tempo de vida, o tratamento paliativo se torna prioritário para garantir qualidade devida, conforto, dignidade, sendo forçoso, pois, o reconhecimento do dano extrapatrimonial, no caso em comento, que se apresenta in
re ipsa.
Trago, ainda, a ementa do referido julgado:
APELAÇÃO CÍVEL. DIREITO ADMINISTRATIVO E CONSTITUCIONAL. AÇÃO INDENIZATÓRIA. HOSPITAL MUNICIPAL. RESPONSABILIDADE OBJETIVA (ART. 37, §6º, DA CRFB/88). PROVA PERICIAL. AUSÊNCIA DE NEXO CAUSAL ENTRE A CONDUTA
DO RÉU E O ÓBITO DO PACIENTE. FALHA EVIDENCIADA, CONTUDO, QUANTO À OMISSÃO NO DEVER DE OFERTAR CUIDADOS PALIATIVOS FACE À DOENÇA TERMINAL EM ESTADO AVANÇADO. INOBSERV NCIA DE PROTOCOLO DO MINISTÉRIO
DA SAÚDE. DANO MORAL IN RE IPSA. REFORMA DA SENTENÇA.
- Inconformismo da autora com a improcedência do pedido indenizatório por danos morais, argumentando que embora seu companheiro se
encontrasse em estado avançado de doença terminal, a perícia constatou que o réu deixou de oferecer conforto, dignidade e humanidade no
tratamento e no cuidado com o paciente, violando o princípio da dignidade humana.
- Hipótese de Responsabilidade objetiva, com base na Teoria do Risco Administrativo (Art. 37, § 6º, da CRFB/88), segundo a qual basta a
simples comprovação do fato (conduta comissiva ou omissiva) e da relação de causalidade entre esse e o dano suportado para que se configure
a responsabilidade dos entes públicos.
- Embora não haja nexo causal entre a conduta do réu e o óbito do paciente, a perícia técnica foi conclusiva no sentido de que não foram
dispensados ao companheiro da autora os cuidados paliativos exigidos ao tratamento da doença terminal que o acometia, conforme protocolo
do Ministério da Saúde.
- Dano moral in re ipsa, ora fixado em R$ 5.000,00 (cinco mil reais), considerando que o óbito do companheiro da autora não adveio de qualquer conduta do réu e ocorreu quatro dias após a internação, sendo a sobrevida do paciente de sete dias, de acordo com o laudo pericial.
PROVIMENTO PARCIAL DO RECURSO
(TJ-RJ - APL: 02620667320138190001 RJ 0262066-73.2013.8.19.0001, Relator(a): Des(a). MARIA HELENA PINTO MACHADO, Data de
Julgamento: 23/10/2019, Quarta Câmara Cível, Data de Publicação: 31/10/2019)
Por esses motivos, entendo que a houve falha no atendimento prestado pela equipe das acionadas aos acionantes (e seu filho recém nascido),
marcado pela conduta negligente e a técnica dos profissionais de saúde que deixaram de atender, de maneira adequada, o recém-nascido, se
omitindo, também, do cumprimento de diversos deveres inerentes ao exercícios de suas atividades, como prestação de cuidados paliativos,
devido esclarecimento e consentimento dos genitores quanto às condutas a serem adotada (ou não adotadas) em razão do seu filho, dentre
todas as demais questões já exauridas no corpo desta sentença.
Reconheço, assim, que, no caso em comento, sequer foram adotados os meios necessários para a consecução dos fins objetivados com o
atendimento que incumbia aos colaboradores das acionadas: atendimento pleno à saúde do recém nascido e fornecimento de cuidados paliativos. Ademais, houve, ainda, violações específicas a obrigações associadas ao exercício da medicina e da assistência à saúde, como o devido
consentimento informado dos genitores acerca da condição do seu filho recém nascido e condutas a serem adoradas, que deveriam ter sido
acordadas entre os pais e a equipe médica.
Com isso, concluo pela existência de responsabilidade civil das acionadas, e consequente dever de indenizar os acionantes, por conta dos
danos causados pelo atendimento defeituosamente prestado pela equipe que atendeu os acionantes (e seu filho recém nascido).
Certo é, também, que o dano vivido pelos acionantes é de extrema relevância, pois repercutiu em angústia, sofrimento e abalos psicológicos
difíceis de serem superados. Também, não pode ser ignorado o dano à dignidade e saúde do filho dos acionantes.
O Código de Defesa do Consumidor estabelece como direito básico dos consumidores (art. 6º) a efetiva indenização pelos danos sofridos em
decorrência da relação de consumo (VI).
Quanto ao valor a ser atribuído à indenização, este deve ser fixado de acordo com a extensão do dano, capacidade econômica do ofensor, de
modo a não gerar uma indenização ínfima perante os transtornos sofridos, mas que também não configure um enriquecimento indevido às
custas do ofensor. Ainda, para o presente caso, importa atentar para o caráter educativo da indenização, que, neste momento, visa conscientizar as acionadas sobre o ilícito praticado pelos seus colaboradores (corpo clínico do Hospital Teresa de Lisieux, credenciada ao plano de saúde
Hapvida), a fim de que estes reincidam nessa conduta desidiosa.
Por essas razões, fixo o montante da indenização em R$ 50.000,00 (cinquenta mil reais), para cada um dos acionantes, valor esse que deve ser
corrigido pelo IPCA, desde esta data, e acrescido de juros de mora de 1% ao mês, a partir da citação.
Pelo exposto, JULGO PROCEDENTE em parte a ação, extinguindo-a com resolução do mérito, nos moldes previstos no Inc. I, do art. 487, do
Código de Processo Civil, para condenar as acionadas ao pagamento solidário de indenização no valor de R$ 50.000,00 (vinte mil reais), para
cada um dos acionantes, devendo tal valor ser ser corrigido pelo IPCA, desde esta data, e acrescido de juros de mora de 1% ao mês, desde a
citação.
Condeno, ainda, as acionadas ao pagamento integral das custas processuais, bem como honorários de sucumbência, os quais fixo em 15%
(quinze por cento) do valor da condenação, fulcro art. 85, CAPUT e §2º, do CPC.
Proceda a Serventia com a RETIFICAÇÃO DO POLO PASSIVO para que conste como segunda acionada a empresa ULTRA SOM SERVIÇOS
MEDICOS S.A., inscrita no CNPJ de n° 12.361.267/0103-18, conforme requerido ao ID 116715526 (fl. 01), dada a modificação da razão social