TJBA - DIÁRIO DA JUSTIÇA ELETRÔNICO - Nº 3.074 - Disponibilização: quinta-feira, 7 de abril de 2022
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motivadamente de forma que seu decisum apresente as razões e os motivos que lhe formaram o convencimento, conforme a
dicção do artigo 371 do Código de Processo Civil.
Diante da questão deve-se ressaltar, ainda, que os policiais militares se enquadram em classe especial de servidores públicos,
possuindo estatuto e regulamentos próprios que os submetem ao fiel cumprimento dos deveres e obrigações que lhes são prescritos. Assim, é de se mencionar, que em existindo resquícios disciplinares haverá perfeita possibilidade da aplicação de medida
punitiva por parte da Administração.
Noutro prisma, a Lei 7.990/2001 apresenta o rol exemplificativo das transgressões disciplinares sendo que no regime administrativo não se aplica o princípio da taxatividade próprio ao direito penal, sendo que o poder disciplinar é discricionário e a administração pode e deve aplicar a sanção de acordo com o interesse público.
O rol das faltas disciplinares contido na lei estatutária não é exaustivo, sendo apenas exemplificativo, por total impossibilidade
de se exaurir as possíveis condutas praticadas por servidores públicos e necessárias de apuração sob a ótica ético disciplinar,
diferentemente do Direito Penal em que vigora o princípio da tipicidade.
Nessa senda, LÉO DA SILVA ALVES, preconiza que:
“O direito disciplinar, por sua vez, é orientado pelo princípio da atipicidade das faltas disciplinares. Isso significa que não há tipos,
mas figuras infracionais. Os tipos, como vimos, são próprios do direito penal criminal, representados pela descrição exaustiva da
conduta.(...) Em que pese a relação estreita do processo penal com o processo disciplinar, não há que se falar em tipificação de
faltas disciplinares. Isso porque o rol de condutas marginais no serviço público é tão amplo que nenhum exercício de criatividade
esgotaria o campo da previsão.” (ALVES, Léo da Silva, Direito Disciplinar. São Paulo: Edipro, 2012, págs. 144/145).
Ademais, é bom que se frise, uma vez tendo sido descritos na Portaria os dispositivos violados, quer dizer aqueles que correspondem às transgressões disciplinares fomentadas, será oportunizado à Defesa, ao longo da instrução processual, a ilidir as
inculpações recaídas, como no caso ocorreu. Ipsis litteris:
RECURSO ORDINÁRIO EM MANDADO DE SEGURANÇA. ADMINISTRATIVO. SERVIDOR PÚBLICO. PROCESSO DISCIPLINAR. PRESCRIÇÃO. NÃO OCORRÊNCIA. PORTARIA INAUGURAL. INDICAÇÃO DE TODOS OS DISPOSITIVOS VIOLADOS.
DESNECESSIDADE. EXCESSO DE PRAZO. NULIDADE. INEXISTÊNCIA. ABSOLVIÇÃO NA ESFERA PENAL. NÃO APLICAÇÃO. EXAME DE MÉRITO DO ATO ADMINISTRATIVO. MPOSSIBILIDADE. COMPETÊNCIA DA AUTORIDADE RESPONSÁVEL PELA APLICAÇÃO DA SANÇÃO DISCIPLINAR.
2 - Em sede processo administrativo disciplinar, o servidor acusado se defende dos fatos que configuram a infração, e não de
sua capitulação legal.(...)
7 - Recurso a que se nega provimento.
(RMS 11841 / SP RECURSO ORDINÁRIO EM MANDADO DE SEGURANÇA 2000/0032035-8. Relator: Ministro PAULO GALLOTTI (1115) T6 - SEXTA TURMA do STJ.
RECURSO EM MANDADO DE SEGURANÇA. INVESTIGADOR DE POLÍCIA. PROCESSO ADMINISTRATIVO DISCIPLINAR.
DEMISSÃO.
1. Não há vício no processo administrativo quando não apontados os dispositivos legais tidos por violados, eis que o indiciado se
defende não da capitulação legal, mas dos fatos que lhe são imputados.
3. Recurso não provido.
(RMS 11625/PA. RECURSOS ORDINARIO EM MANDADO DE SEGURANÇA. 2000/0019142-6. Relator: Ministro EDSON VIDIGAL (1074) T5 - QUINTA TURMA do STJ).
Nesse mesmo sentido, o Superior Tribunal Militar se pronunciou:
EMENTA: PREVARICAÇÃO. ATIVIDADE DE INSPEÇÃO NAVAL. ATO DE OFÍCIO. OMISSÃO. EMENDATIO LIBELLI. DESPROVIMENTO. Hipótese em que o Acusado e outro militar, ambos integrantes de equipe de inspeção naval, restaram condenados no
Juízo de origem, como incursos no delito de Prevaricação, tipificado no art. 319, do CPM. O referido tipo pode ser classificado
como multinuclear, ou seja, aquele no qual vários comportamentos (núcleos) são descritos no seu preceito primário. Os verbos
descritos nesse preceito são “retardar ou deixar de praticar” ou “praticá-lo”. Por conseguinte, verifica-se que o tipo em análise
descreve condutas omissivas e comissivas. In casu, o Acusado e seu comparsa deixaram de praticar, “indevidamente, ato de
ofício”, consistente em realizar notificação de embarcação que navegava sem a competente CTS. Restou caracterizado que a
conduta omissa foi praticada para satisfazer interesse ou sentimento pessoal. O Juízo de origem, sem modificar a descrição
do fato contida na Denúncia, atribuiu-lhe nova definição jurídica, incursionando o Acusado em dispositivo legal, cuja pena em
abstrato é menor do que a dos crimes capitulados pelo MPM em suas peças acusatórias. Como é cediço, o Acusado defende-se
dos fatos que lhe são atribuídos na Denúncia, sendo, pois, secundária a classificação que lhe foi dada pelo Dominus Litis. Desse modo, a capitulação indicada pelo Parquet não vincula o juiz da causa, seja em Primeiro Grau, seja na Segunda Instância,
como bem expressado no brocardo jurídico “narra-me o fato e te darei o direito”. Nesse passo, embora limitada ao julgamento
do fato conforme originalmente imputado ao Acusado, o Juízo de origem de nenhum modo estava vinculado ao pedido do Parquet de condenar o Acusado, seja por Corrupção passiva, seja por Concussão. Desprovimento do Apelo. Maioria. (STM - APL:
70005813920197000000, Relator: LUIS CARLOS GOMES MATTOS, Data de Julgamento: 04/06/2020, Data de Publicação:
21/09/2020)
Vale ressaltar também que, na esfera administrativa, vige o princípio do formalismo moderado que permite que a rigorosidade
empregada na esfera penal seja um pouco minorada em face do objeto que se busca. Nessa linha, bem pontuou Medauar: é
certo que vigora no Direito Processual Administrativo o princípio do formalismo moderado ((Direito administrativo moderno. 4 ed.
rev. atual. ampl. São Paulo: RT, 2000. p. 205).
Ainda nesse espeque, o Autor não demonstrou, no caso em comento, qualquer prejuízo à defesa, sendo que nos processos
administrativos, apenas se declara a nulidade de um ato quando houver efetiva demonstração de prejuízo à defesa, por força da
aplicação do princípio pas de nullité sans grief, não havendo efetiva comprovação nos presentes autos de prejuízos suportados.
Nesse sentido está a jurisprudência pátria: